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julho 28, 2009

Sonata da Paixão, por Helena Sut

Meu primeiro colo foi um canteiro.
Minha mãe tem nome de flor.

O ventre solo acolheu-me semente e lançou-me ao mundo rebento rosa chá.

Encontrei-me no sonho acolhido e flutuei no cerne da vida.

Minha mãe dizia entre risos que o meu pai tinha cheiro de alecrim.

Rosmaninho, orvalho do mar, folhas labiadas…

O tempero e a cor da minha trama.

Na concepção incorporei a maresia no oceano tranqüilo entranhado no corpo e percebi as marés e as luas na orla, protegida sobre as pedras do cais feminino.
Cresci com a dor do primeiro botão.

A saliência despertou no caule das primaveris vivências e desprendeu o tronco com circunstâncias de ventos.

Entornei o vinho dos virginais desejos e encontrei na carne as chagas do corpo em cruz.

Das cicatrizes, espinhos… Espinhos?

Dizem que resguardam os sonhos e debelam os medos, mas tem noites em que perco o sono, encolho-me, não percebo as alegorias e ainda sinto a aflição dos espinhos cravados na pele da lembrança.
Encontrei-me rubra com as pétalas revoltas.

Os caminhos… Tantas opções e apenas uma posse de passos.

Multiplicação de espinhos, ciclos de espera e renovação…

Passei em procissão e ornei o templo com fantasias.

Compreendi a sonata que repercutia e ritmava meus movimentos.

Tantas vezes me rebelei em sons discordantes.

Sangrei destinos e me cerzi em alguns acasos.

Moldura de risos, superfície de falsos planos…

Eu, o retrato enraizado no canteiro de um espelho; eu, o reflexo emoldurado em outras perspectivas…
Reconheci que paixão é um substantivo feminino como também a vida.

Brinquei com palavras e me conjuguei amor, busquei complementos em corpos etéreos, encontrei-me entre estrelas e pousei orvalho da noite no colo sereno da percepção do próprio ventre.

Pontuei orações com pétalas e espinhos sem finalizar as reticentes sementes manifestas no tempo.
Assumi a autoria de ser mulher.

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